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Androides - partilha de alguém que já procurou Deus no google e na agenda do celular

  • Tathi Pio
  • 27 de nov. de 2018
  • 2 min de leitura

Sabe, nem sei exatamente quando você se tornou tão essencial assim pra mim.

De repente percebi que sem você eu quase não existia.

Sem você não acordo na hora marcada, não sei ir nem voltar, não sei se marcaram reunião. Não converso com minha mãe, não recebo feliz aniversário, nem sei que horas são.

Não recebo propostas de trabalhos, não sei qual lanche é mais barato ou se já é horário de verão. Não ando de Uber e similares, não sei se tem evento nos lugares, nem tiro dúvidas sobre gestação.

Você se tornou meu melhor amigo. Um comigo. Vai onde eu vou. Já me salvou de tristezas profundas com sua distração.

Companheiro diário de diversos lugares e dorme até no meu colchão.

Você foi meu refúgio muitas vezes na fila do banco, cartório, na sala de espera do consultório… quando não queria conversar com ninguém, lá estava você.

Mas percebi que nossa aproximação começou a se tornar doentia… Quando me distanciava por pouco tempo já sentia uma vontade grande de te ter por perto.

Colocaram em você tantas (f)utilidades que sua química me viciou e vi que nosso relacionamento não estava dando certo.

Sei que com você eu vou além. E mais que uma pessoa, sou um perfil. Mas bem perdida... E olhando para o lado, não encaro o meu mundo de frente e mesmo doente, ainda me alimento de vida.

Você aproxima os distantes, mas afasta os que estão aqui Você me distrai das tristezas, mas não me ensina encará-las com profundidade. Você me traz tantas informações que na verdade já me esqueci. Você é meu refúgio, mas me impede de navegar na minha realidade.

Ainda não morri para ser apenas um corpo presente na humanidade...

Mesmo sabendo de tudo isso, não consigo te odiar de verdade... Se eu pudesse instalava um aplicativo de ´desnecessidade’. Para te deletar do meu pensamento obsessivo.

Sinto-me sem forças para nadar contra sua maré... Sou presa da sua teia. Todos somos, ‘mané’. Não tenho coragem de rasgar a rede e sair nadando no vasto oceano sabendo que estão presos juntos nesse aparelho, quase todos os que amo.

Mas sabe… tenho um coração que deseja algo essencial aqui dentro. Algo pleno, leve... que está aqui mas não sei como foi que se perdeu. Não… dessa vez não falo com nem de você, celular... De uma vez por todas: - nunca fui sua, quem te possui sou eu.

É algo que não tem no Google nem na minha agenda Pura delícia de somente respirar fundo e olhar pra fora. Não há cartão de memória que consiga armazenar os registros de todos meus sentidos em estar vivendo com Você aqui meu constante agora.


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